Professora Silvéria Santos relata como a medicalização do parto sufocou o trabalho dessas profissionais. Estudo faz parte de seminário internacional
O ofício das parteiras, comum até a década de 1970, foi silenciado pela medicina moderna. “No Distrito Federal, a tradição foi submetida ao processo hegemônico do projeto modernista da região”, explica a professora Silvéria Maria Santos, do Departamento de Enfermagem da Universidade de Brasília. Em sua tese de doutorado, defendida no departamento de História, Silvéria recupera a memória das parteiras do Entorno, cujos saberes são transmitidos por meio da tradição oral, passada de geração em geração.
“As parteiras aprendem partejando, auxiliando as parteiras mais experientes”, afirma a professora. Segundo ela, o excesso de medicalização e a valorização do conhecimento “racional e quantificado” desqualificaram o trabalho dessas mulheres. “Mesmo nas áreas rurais, verificamos um aprendizado escasso desse ofício, em função da institucionalização e do controle rígido sobre outras formas de atendimento à mulher”, diz. Ela afirma que as principais prejudicadas são as mulheres que não precisariam de intervenção médica e gostariam de realizar o parto em casa.
Silvéria conta que a principal dificuldade da pesquisa foi encontrar as parteiras. “Uma pessoa me levava à outra, que dizia que conhecia alguém que 'pegava criança', como se diz”, explica a professora. “Mas as parteiras não estão em extinção, elas estão silenciadas”. O mais grave, segundo Silvéria, é o fato de que as mulheres que exercem o ofício no DF não estão reunidas em associações, como no resto do país. “Aqui elas não mereceram nem um registro”, lamenta. “Daí a importância desse trabalho de ir buscar no não-dito, como diz Foucault, essas pessoas que perderam a voz”.
A professora Daphne Rattner, do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília, diz que existe uma falsa crença de que o parto deve ser rápido, para que a mãe e o bebê sofram menos. Em muitos hospitais, os médicos injetam na mulher um coquetel de hormônios para acelerar o parto, o que atrapalha o ritmo de analgesia natural do organismo. “As mulheres recebem injeções de ocitocina, que aceleram as contrações, e não conseguem produzir endorfina no mesmo ritmo para aliviar a dor”, diz. O resultado é um processo extremamente doloroso.
HUMANIZAÇÃO – A pesquisa será apresentada na III Conferência Internacional sobre Humanização do Parto e Nascimento, que acontece de 26 a 31 de novembro, no Centro de Convenções Ulyssses Guimarães. “Nós queremos uma mudança de paradigma. O projeto de humanização não é só do parto, mas da sociedade”, afirma a presidente do evento, a médica epidemiologista Daphne Rattner, do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília. A programação inclui palestra da coordenadora de Saúde da Mulher da Organização Mundial da Saúde (OMS), Islene Araújo de Carvalho, debates com especialistas internacionais, painéis com experiências bem-sucedidas no sistema de saúde brasileiro, cursos e apresentações de trabalhos. O evento é organizado pela Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (ReHuNa).
Um dos destaques da programação é o que a organização chamou de “espaço dialogado”, com a presença da pesquisadora Ellen Hodnett, da Universidade de Toronto, no Canadá. Hodnett foi a responsável pela Revisão Cochrane Internacional de local de parto, que compila o que foi publicado em relação a cada um dos locais em que a mulher pode escolher dar à luz, como hospitais ou a própria casa. O debate também vai ter a presença da professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Simone Diniz.
Durante todos os dias da conferência, das 8h30 às 10h15, serão apresentados painéis de experiências bem sucedidas no sistema público de saúde brasileiro. “O movimento BH pelo parto normal e a comissão perinatal” mostra o trabalho realizado em sete hospitais públicos de Belo Horizonte com doulas comunitárias – mulheres voluntárias que tiveram experiências positivas no parto e se especializaram em dar apoio emocional durante o processo. Outro painel se dedica a mostrar projetos de centros brasileiros especializados em garantir à mulher com o vírus HIV o direito de engravidar, fornecendo todo o suporte necessário.
No dia 29 de novembro, às 10h30, pesquisadores do México, São Paulo e Ceará debatem a violência institucional contra a mulher – assédio moral, casos de violência verbal e sexual ocorridos dentro da própria sala de parto. Haverá ainda uma conferência magna da organização não-governamental International MotherBaby Childbirth Initiative (IMBCI), que vai apresentar dez recomendações para um parto respeitoso, resultado de uma pesquisa com organizações especializadas em amamentação e nascimento de 163 países.
Fonte: Barbara Arato - Da Secretaria de Comunicação da UnB
Agência UnB
O ofício das parteiras, comum até a década de 1970, foi silenciado pela medicina moderna. “No Distrito Federal, a tradição foi submetida ao processo hegemônico do projeto modernista da região”, explica a professora Silvéria Maria Santos, do Departamento de Enfermagem da Universidade de Brasília. Em sua tese de doutorado, defendida no departamento de História, Silvéria recupera a memória das parteiras do Entorno, cujos saberes são transmitidos por meio da tradição oral, passada de geração em geração.
“As parteiras aprendem partejando, auxiliando as parteiras mais experientes”, afirma a professora. Segundo ela, o excesso de medicalização e a valorização do conhecimento “racional e quantificado” desqualificaram o trabalho dessas mulheres. “Mesmo nas áreas rurais, verificamos um aprendizado escasso desse ofício, em função da institucionalização e do controle rígido sobre outras formas de atendimento à mulher”, diz. Ela afirma que as principais prejudicadas são as mulheres que não precisariam de intervenção médica e gostariam de realizar o parto em casa.
Silvéria conta que a principal dificuldade da pesquisa foi encontrar as parteiras. “Uma pessoa me levava à outra, que dizia que conhecia alguém que 'pegava criança', como se diz”, explica a professora. “Mas as parteiras não estão em extinção, elas estão silenciadas”. O mais grave, segundo Silvéria, é o fato de que as mulheres que exercem o ofício no DF não estão reunidas em associações, como no resto do país. “Aqui elas não mereceram nem um registro”, lamenta. “Daí a importância desse trabalho de ir buscar no não-dito, como diz Foucault, essas pessoas que perderam a voz”.
A professora Daphne Rattner, do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília, diz que existe uma falsa crença de que o parto deve ser rápido, para que a mãe e o bebê sofram menos. Em muitos hospitais, os médicos injetam na mulher um coquetel de hormônios para acelerar o parto, o que atrapalha o ritmo de analgesia natural do organismo. “As mulheres recebem injeções de ocitocina, que aceleram as contrações, e não conseguem produzir endorfina no mesmo ritmo para aliviar a dor”, diz. O resultado é um processo extremamente doloroso.
HUMANIZAÇÃO – A pesquisa será apresentada na III Conferência Internacional sobre Humanização do Parto e Nascimento, que acontece de 26 a 31 de novembro, no Centro de Convenções Ulyssses Guimarães. “Nós queremos uma mudança de paradigma. O projeto de humanização não é só do parto, mas da sociedade”, afirma a presidente do evento, a médica epidemiologista Daphne Rattner, do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília. A programação inclui palestra da coordenadora de Saúde da Mulher da Organização Mundial da Saúde (OMS), Islene Araújo de Carvalho, debates com especialistas internacionais, painéis com experiências bem-sucedidas no sistema de saúde brasileiro, cursos e apresentações de trabalhos. O evento é organizado pela Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (ReHuNa).
Um dos destaques da programação é o que a organização chamou de “espaço dialogado”, com a presença da pesquisadora Ellen Hodnett, da Universidade de Toronto, no Canadá. Hodnett foi a responsável pela Revisão Cochrane Internacional de local de parto, que compila o que foi publicado em relação a cada um dos locais em que a mulher pode escolher dar à luz, como hospitais ou a própria casa. O debate também vai ter a presença da professora da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), Simone Diniz.
Durante todos os dias da conferência, das 8h30 às 10h15, serão apresentados painéis de experiências bem sucedidas no sistema público de saúde brasileiro. “O movimento BH pelo parto normal e a comissão perinatal” mostra o trabalho realizado em sete hospitais públicos de Belo Horizonte com doulas comunitárias – mulheres voluntárias que tiveram experiências positivas no parto e se especializaram em dar apoio emocional durante o processo. Outro painel se dedica a mostrar projetos de centros brasileiros especializados em garantir à mulher com o vírus HIV o direito de engravidar, fornecendo todo o suporte necessário.
No dia 29 de novembro, às 10h30, pesquisadores do México, São Paulo e Ceará debatem a violência institucional contra a mulher – assédio moral, casos de violência verbal e sexual ocorridos dentro da própria sala de parto. Haverá ainda uma conferência magna da organização não-governamental International MotherBaby Childbirth Initiative (IMBCI), que vai apresentar dez recomendações para um parto respeitoso, resultado de uma pesquisa com organizações especializadas em amamentação e nascimento de 163 países.
Fonte: Barbara Arato - Da Secretaria de Comunicação da UnB
Agência UnB
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